Este é um livro sobre juízes. Juízes que assumiram uma enorme importância, o que à partida é positivo e natural, se bem entendermos o funcionamento da Constituição. Onde antigamente em situações de crise se esperava que um Marechal Saldanha ou Gomes da Costa desembainhassem a espada e corressem bordejados pelos seus canhões pela estrada abaixo para mudar o regime, hoje, aguarda‑se que da serenidade da judicatura venha essa mesma atitude, sem sangue, dentro da Lei.
Os dois argumentos iniciais deste livro são os seguintes: assistimos a um protagonismo político inovador por parte da magistratura portuguesa. Esse protagonismo está dentro da esfera das atribuições e competências dos juízes no entendimento que a Constituição é uma Constituição harmoniosa, que deve funcionar tranquilamente quando os poderes se respeitam e estão em equilíbrio, mas que permite uma intervenção forte dos juízes quando a tranquilidade desaparece, os poderes se tornam autoritários ou descontrolados (como foi recentemente o caso em Portugal); contudo, esta intervenção deve ser equilibrada. E este é um perigo da presente situação, onde antes a farda militar intervinha para impôr a ditadura militar, não deve agora a beca negra substituir‑se e impôr a ditadura judicial. Não se deve substituir um autoritarismo por outro.
A espada militar não deve ser substituída pela espada da Justiça, mas sim pela balança.
Um Estado de ilegalidade não cederá a outro Estado de ilegalidade; mesmo que as decisões pareçam agradar ao povo soberano, tal não lhes dá legitimidade democrática, nem jurídica. O poder judicial deve equilibrar, harmonizar, mas não dar vazão à demagogia populista, nem à tirania da Lei.
Pouco se sabe sobre as mentes que agora também nos governam.
Como decidem os juízes? São influenciados pela política? Para que servem os juízes? O que se deve esperar deles? Qual a sua função? Os juízes portugueses são bons e cumprem a sua função?
Estas são outras questões a que se tentará responder neste texto.
Diariamente vemos os juízes em acção destemida ou temida. Alguns tornam‑se estrelas, ainda não adoradas como o CR7, mas para lá caminhando ou pelo menos já se apresentando com escuros óculos hollywoodescos; um “star system” vai‑se implantando. Outros tornaram‑se oráculos televisivos de quem se espera com ânsia a declaração do montante do salário a receber no mês seguinte.
A par do espectáculo, também são de comum conhecimento as sentenças ou acórdãos estapafúrdios, sem qualquer consideração pelo Direito, ou as contradições e confusões inexplicadas e inexplicáveis que são lavradas pelos magistrados.
As cerimónias litúrgicas da magistratura judicial – como a abertura do ano judicial – passaram, por vezes, a ser manifestações sindicais de juízes em que o queixume constante é a falta de dinheiro ou então exercícios intelectuais panglossianos de afirmação de que está tudo no melhor dos mundos e o que não está, não é certamente culpa dos juízes, que nada têm a ver com a economia ou com a política.